quarta-feira, 3 de junho de 2009

A criatura e o homem

POR THIAGO AUGUSTO

Olhou-me fixamente, parado inesperadamente diante de mim, depois que eu finalmente acordei. Eu devolvi o meu olhar, com curiosidade. Ele era alto e muito magro, e vestia uns trapos velhos e sujos. Parecia não cortar o cabelo havia muito tempo, assim como a barba, e eles estavam imundos. Suas costas, curvadas, pareciam carregar um fardo muito pesado. E as muitas cicatrizes que cobriam seu rosto suas mãos suas pernas sugeriam para mim que ele teve uma vida de sofrimento. Mas era um auto-sofrimento, pois eu não poderia imaginar alguém o machucando. Sim, sem dúvida, auto-sofrimento! As cicatrizes eram culpa dele, e eu tive certeza disso apenas em olhá-lo nos olhos. Estes quase saltavam para fora de seu rosto ossudo, agressivos e ameaçadores, mas faiscando com uma luz de curiosidade e, ao mesmo tempo, eram profundos – ao percebê-lo, eu senti como se caísse vertiginosamente, sem esperança de que a queda pudesse chegar a um fim. Eu senti pena dele, no começo, mas pouco a pouco um sentimento de medo foi tomando conta de mim. Pois, pela sua aparência, ele poderia ser um homem de mau caráter, uma ameaça para mim mesmo – como tal homem poderia inspirar qualquer tipo de simpatia?

E eu devo admitir que a minha vida é preciosa. Eu sou importante para o mundo, eu tenho uma forte influência na vida das pessoas. E eu tenho esposa e filhos, também. E eu tenho uma excelente aparência! Sim, eu sou muito bonito, e as minhas roupas são as mais caras. E – sempre são muitos os "es" - eu dou dinheiro para os pobres, e eu vou à igreja todos os domingos, e eu amo a Natureza e sempre tento torná-la útil para as pessoas... Eu sou o Homem, como ele deve ser, como ele é. E aquele homem! Oh, meu amado e adorado deus! Por favor, jesus cristo! Aquele homem era o oposto de mim.

Eu sabia que devia escapar, era a única opção. Mas, quando dei o meu primeiro passo, prestes à correr, eu notei que ele também se movia! E quanto mais eu me movia, mais ele se movia. Oh, não havia como escapar! Apavorado, desesperado e arrebatado, eu de repente percebi o que no fundo do meu coração eu já suspeitava. Eu não estava olhando para uma outra pessoa, mas para o meu reflexo no espelho!



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